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A Série de Balmer e o Espectro do Hidrogênio

O que é um espectro. O espectro do hidrogênio. A série de Balmer. O quantum de Planck. O modelo de Bohr.

Se você leu nossa seção especial sobre AS CORES DA LUZ, deve saber direitinho o que é o espectro de um elemento e pode começar direto na Página 2 desse relato. Se não leu, deve dar um pulinho lá e depois voltar. Ou, se está com preguiça, comece pela Página 1, abaixo, onde fazemos uma pequena recapitulação.

O que são os espectros e como observá-los.

Assim como as impressões digitais identificam uma pessoa, o espectro de um elemento químico identifica esse elemento. Muito simplificadamente, a receita para se observar o espectro de um elemento é a seguinte.

1) Convença o elemento a emitir luz. Você consegue isso aquecendo o elemento até altas temperaturas, mas, costuma-se usar outra técnica. Coloca-se um pouco do elemento em uma ampola de vidro previamente evacuada. Se o elemento, naturalmente, já é um gás, como o hidrogênio, basta colocar um pouco desse gás na ampola. Se for um líquido, como o mercúrio, ou um sólido, como o sódio, põe-se uma pequena quantidade desse material na ampola e faz-se o vácuo. Com isso, o elemento vira vapor dentro da ampola. Esse é o caso das lâmpadas de vapor de mercúrio que vemos nas ruas. Passa-se uma corrente elétrica pelo gás ou vapor e pronto: ele emite luz. A gente diz que o gás foi “excitado”.

2) Concentre a luz vinda da ampola com o elemento excitado em um anteparo com uma fenda estreita. Isso pode ser feito com a ajuda de lentes que não são mostradas na figura.

3) A luz que passa pela fenda atravessa então um objeto “dispersor”, isto é, um dispositivo que separa a luz em suas cores componentes. No desenho, esse dispositivo é um prisma mas, no laboratório, costuma ser uma rede de difração.

4) Projete as componentes separadas pelo dispersor em uma tela. Cada uma será uma imagem da fenda com a cor da componente respectiva. Essas imagens são chamadas de “raias” ou “linhas”. O conjunto de linhas é o espectro do elemento.

Essa é a receita. Com esse tipo de espectro os físicos e químicos conseguem saber um monte de coisa sobre o elemento que emitiu a luz. Toda a física atômica moderna começou com a análise desses espectros. Nosso objetivo, nas próximas páginas, é explicar como isso aconteceu. Passe adiante, por favor.

O espectro do hidrogênio e a série de Balmer.

O hidrogênio é o elemento mais leve e o que tem o espectro mais simples. O espectro do hidrogênio tem quatro raias mais ou menos intensas que são visíveis aos nossos olhos e várias outras que não são. A figura abaixo mostra as quatro linhas visíveis. Cada raia tem um nome de batismo dado pelos espectroscopistas: a vermelha, por exemplo, é a raia H.

Os números indicam o comprimento de onda da luz de cada componente em uma unidade chamada Angstrom, muito usada em espectroscopia. É um comprimento pequeno; 1 Angstrom vale 0,00000001 centímetros, ou 10-8 cm.

Veja abaixo uma tabela listando as quatro raias do espectro visível do hidrogênio. Cada raia é identificada por sua cor, seu nome, seu comprimento de onda em Angstroms e um número inteiro n que terá papel fundamental em nosso relato.

Em 1885, o professor secundário suiço Johann Balmer meditou sobre esses números procurando um jeito de organizá-los. Esse é o ofício dos cientistas: dar ordem e sentidos aos números obtidos nas experiências. E Balmer teve sucesso. Depois de algumas tentativas achou uma fórmula relativamente simples que condensa todos os dados da tabela acima. É a seguinte:

Nessa fórmula, λn é o comprimento de onda, em Angstroms, da raia de número n do espectro do hidrogênio. n é um inteiro igual ou maior que 3.

Vejamos se ela dá certo para a raia vermelha que tem n = 3. Substituindo 3² = 9 na fórmula, achamos:

λ3 = 3644 ( 9 / (9 – 4)) = 6562,8 Angstroms!

Pegue a calculadora e faça as contas para as outras três linhas. Leve em conta que pequenas discrepâncias são naturais e devidas às incertezas experimentais. (Teóricos não erram! Ha, ha, ha.)

Logo se notou que essa fórmula também servia para as linhas invisíveis do espectro do hidrogênio, bastando trocar o 2² da fórmula por outro número ao quadrado. Por exemplo, usando 1² = 1, obtemos a série de Lyman, do ultravioleta, com valores de n tomados de 2 para cima. Do outro lado do espectro estão outras raias invisíveis, na faixa chamada de infravermelho. Os comprimentos de onda dessas séries de raias também são obtidas da fórmula de Balmer, trocando o 2² por 3² etc, e usando ns maiores que 3, 4 etc.

Tudo isso foi generalizado pelo físico sueco Johannes Rydberg, em 1890, com uma fórmula que engloba a fórmula de Balmer e inclui todas as raias do espectro do hidrogênio, visíveis ou não. É a seguinte:


Veja o significado dos personagens dessa fórmula:

nf é um inteiro cujo valor indica que série de linhas a fórmula representa. Para a série de Lyman (ultravioleta), nf = 1; para a série de Balmer (visível), nf = 2; para a série de Paschen (infravermelho), nf = 3 etc.

ni é o mesmo n da fórmula de Balmer. Para cada série, seu valor começa com nf + 1 e vai subindo. Portanto, ni é sempre maior que nf.

RH é uma constante chamada de número de Rydberg e vale RH = 0,0010968 (A-1).

Pegue novamente a calculadora e comprove que a fórmula de Rydberg dá certo para as linhas da série de Balmer. Não esqueça que o comprimento de onda está ao inverso nessa fórmula.

Fórmulas como essa são chamadas de “empíricas”, termo técnico para indicar uma equação achada na base do velho chute. Na época de Balmer e Rydberg, ninguém entendia porque o espectro do hidrogênio se ajusta tão bem a essas expressões relativamente simples. Quem deu o primeiro passo para desvendar esse enigma foi o dinamarquês Niels Bohr, como veremos. Mas, antes precisamos falar um pouco sobre os “fótons” ou “quanta de luz”, apresentados ao mundo por Max Planck, bem no início do século 20.

O “quantum” de Max Planck.

No final do século passado, a Mecânica Newtoneana e o Eletromagnetismo de Maxwell pareciam capazes de explicar tudo que existe na natureza. Mas, umas certas observações experimentais não queriam se ajustar a essas poderosas teorias. Uma delas, chamada de “espectro do corpo negro”, era a mais estranha e irritante. Trata-se, simplesmente, da forma do espectro de um corpo aquecido, um filamento de lâmpada, por exemplo. Chamar um filamento aquecido de “corpo negro” pode parecer estranho mas aceite isso como uma imposição histórica. Um objeto assim emite luz com frequências que vão do infravermelho ao ultravioleta, passando pelo visível. Fazendo um gráfico da intensidade em função do comprimento de onda, obtém-se uma figura como essa vista abaixo.

Em 1900, Max Planck apresentou uma fórmula matemática que se ajustava como uma luva a essa curva do espectro do corpo negro. Como no caso de Balmer, era também uma fórmula empírica, achada na base da tentativa, mas a concordância com os dados experimentais era impressionante. Só que havia uma novidade. Para achar sua fórmula, Planck precisou “postular” que a luz (visível ou não) é formada de “partículas” ou “pacotes de onda”. Cada pacote tem uma energia que é proporcional à frequência da onda de luz. Isto é, cada pacote carrega uma energia dada por E = h f, onde h é a chamada “constante de Planck” e vale 6,63 x 10-34 joule.seg.

Foi uma hipótese revolucionária. Não havia nenhuma razão para adotá-la, a não ser o ajuste ao espectro do corpo negro. Planck chamou esses pacotes de “quanta” de luz (“quanta” é o plural de “quantum”). Hoje, eles são conhecidos como “fótons”, as “partículas” de luz.

Resumindo: quando todo mundo estava convencido que a luz era formada de ondas eletromagnéticas, como Maxwell dissera e Hertz demonstrara, Planck veio com esses pacotes, como que re-editando a teoria corpuscular de Newton. Poucos anos depois, Einstein deu uma tremenda força a essa hipótese de Planck usando-a para explicar o “efeito foto-elétrico”, outro fato experimental que não se adequava aos ditames da física clássica. E, em 1913, o dinamarquês Niels Bohr usou os “quanta” de luz de Planck para chegar à primeira justificativa teórica das séries de linhas do espectro do hidrogênio.

É o que veremos a seguir.

O átomo de Bohr.

No início do século, Rutherford mostrou que um átomo é formado de um núcleo pequeno e denso, onde residem os prótons (cargas positivas) e igual número de elétrons (cargas negativas), habitando a periferia. Daí veio o costume de se desenhar um átomo como uma bolinha cercada de pontinhos orbitando em seu redor.

Apesar de intuitivo e simpático, todo mundo já sabia que esse modelo é furado. Um átomo assim não teria vida longa pois os elétrons estariam irradiando energia em forma de ondas eletromagnéticas, como manda a teoria clássica. Num instante, os elétrons colapsariam sobre o núcleo e o átomo estaria aniquilado. Como isso, felizmente, não acontece (se acontecesse não estaríamos aqui conversando sobre átomos), ficou claro que “havia algo podre no reino da Dinamarca”. E foi de lá mesmo que veio o salvador da pátria, Niels Bohr, que inventou um novo modelo para o átomo de hidrogênio, que podemos chamar de Hidrogênio 1.0.

O hidrogênio é o átomo mais simples que existe: seu núcleo tem apenas um próton e só há um elétron orbitando em torno desse núcleo. Para explicar a evidente estabilidade do átomo de hidrogênio e, de quebra, a aparência das séries de linhas espectrais desse elemento, Bohr propôs alguns “postulados”. Postular significa pedir. Portanto, Bohr pedia que a gente aceitasse como verdade algumas afirmativas que ele não demonstrava mas que, se fossem verdadeiras, explicavam todo o mistério do Hidrogênio. Eis, a seguir, os postulados de Bohr.

1) O elétron gira em torno do núcleo em uma órbita circular, como um satélite em torno de um planeta, mantendo-se nessa órbita às custas da força elétrica atrativa entre cargas de sinais opostos.

2) A órbita circular do elétron não pode ter qualquer raio. Só alguns valores são permitidos para os raios das órbitas. Esses valores são:

rn = ao n2

onde ao é uma constante chamada de raio de Bohr, e n é um número inteiro (1, 2, 3 …).

Para os curiosos, podemos adiantar que ao = h2 / (4 π2 m e2),, onde h é a nossa conhecida constante de Planck, m é a massa e e é a carga do elétron. Bohr tinha uma boa desculpa para chegar à essa expressão, mas, para nós, fica como ato de fé.

Em outras palavras, o elétron só pode girar em órbitas cujos raios são 1, 4, 9, 16, … vezes o raio de Bohr. O número inteiro n identifica a órbita permitida.

3) Em cada órbita permitida, o elétron tem uma energia constante e bem definida, dada por:

E = E1 / n2,

onde E1 é a energia da órbita de raio mínimo. Para os curiosos, novamente, diremos que Bohr deu uma fórmula para E1:

E1 = – 2 π2 m e4 / h2 = – 13,6 eV.

Observe o sinal menos nessa fórmula. Quanto menor o n, mais interna será a órbita (menor o raio) e mais negativa será a energia do elétron. Os físicos usam energias negativas para indicar “confinamento”. Isto é, um objeto que tem energia negativa está confinado a uma dada região do espaço. Esse é o caso do elétron, confinado à uma órbita bem definida. Se a energia ficar positiva, o elétron fica livre para sair por aí, sem nenhum confinamento.

4) Enquanto estiver em uma de suas órbitas permitidas, o elétron não emite nem recebe nenhuma energia. Esse foi o postulado mais audacioso pois contrariava os preceitos da teoria eletromagnética clássica. Bohr não tinha argumentos para demonstrar que esse postulado era correto, a não ser a evidência óbvia de que o elétron realmente não colapsava sobre o núcleo. A história mostrou que Bohr estava certo e, anos depois, a mecânica quântica explicou porque.

5) Quando um elétron muda de órbita o átomo emite ou absorve um “quantum” de energia luminosa. O “quantum”, como você sabe, é um pacote de energia previsto por Planck.

Vamos detalhar esse quinto postulado pois é dele que sai a primeira explicação convincente para a origem das raias do espectro do hidrogênio.

A energia da órbita de raio mínimo (r1 = a0) é E1. Seu valor é -13,6 eletrons-Volt (eV), unidade de energia muito usada pelos espectroscopistas. A órbita seguinte, de raio r2 = 4 a0, tem energia E2 = -13,6 / 4 = -3,4 eV. A seguinte tem energia E3 = -13.6 / 9 = -1,5 eV, e assim por diante.

Vemos, ao lado, um gráfico representando essa escala de energias “permitidas”. O nível mais baixo, com energia -13.6 eV é chamado de nível fundamental. Os demais são níveis excitados.

Suponha que o elétron está no estado excitado E3 e passa para outro estado excitado E2. Nesse processo, a energia do átomo diminui de -1,5 – (3,4) = 1,9 eV. Para onde vai essa diferença de energia? Ela é emitida pelo átomo na forma de um “quantum” de luz, ou “fóton”. No caso, esse fóton, com essa energia, tem exatamente a frequência da raia vermelha do espectro do hidrogênio!

As outras raias da série de Balmer correspondem às “desexcitações” dos níveis n = 4, 5 e 6 até o nível n = 2.

A série de Lyman, no ultravioleta, corresponde a desexcitações de níveis n = 2, 3 etc até o nível fundamental, n = 1. A série de Paschen, no infravermelho, corresponde a desexcitações até o nível n = 3.

A partir dessa hipótese, Bohr chegou à fórmula de Rydberg. Veja como. Segundo Bohr, a energia de um nível n é dada por En = E1 / n2. A diferença entre as energias, quando o elétron vai de um nível inicial ni para um nível final nf, será, portanto:

E = Ef – Ei = E1 / nf2 – E1 / ni2.

Ora, Planck tinha dito que E = hf = hc /λ. Logo, substituindo E na fórmula acima, obtemos:

onde RH = E1 / hc é a constante de Rydberg. Pronto, a fórmula de Rydberg das raias do hidrogênio estava explicada pelo modelo de Bohr.

Por mais bonitinho que fosse, o átomo de Bohr ainda não era satisfatório. Os postulados levavam a resultados que se ajustavam aos dados experimentais mas muita coisa era simplesmente enfiada goela abaixo, sem maiores justificativas. Além disso, haviam pequenas discrepâncias no espectro do hidrogênio que não eram explicadas pelo modelo. E ele não servia para átomos de outros elementos, que não o hidrogênio.

Uma década mais tarde, todas essas restrições foram resolvidas com um modelo mais avançado, originário da mecânica quântica. Esse modelo explica tudo que se observa experimentalmente nos espectros não só do hidrogênio mas de qualquer outro elemento ou composto. É um modelo de grande sucesso mas sua história fica para outra vez.

Como ver um espectro em sua cozinha

Nem todo mundo tem um prisma em casa para observar as cores componentes da luz de um elemento. Mas, hoje em dia, praticamente todo mundo tem uma rede de difração em casa, de qualidade bem aceitável. Estamos falando de um CD normal, desses de música ou um CD-ROM de computador. É provável que, agora mesmo, você tenha um desses, aí sobre a mesa. Pegue-o e olhe-o na direção de uma lâmpada, inclinando-o de várias maneiras. Você verá um belo padrão de cores bem intensas. Essas cores nada mais são que o espectro da lâmpada que está iluminando o CD. Se for uma lâmpada incandescente comum, você estará olhando, nada mais, nada menos, para o “espectro de um corpo negro”! Se você tivesse um detetor capaz de medir a intensidade de cada cor dispersada pelo CD, você obteria uma curva semelhante a essa vista abaixo.

Em nossa seção de SUGESTÕES PARA FEIRAS DE CIÊNCIA descrevemos algumas experiências simples que você pode fazer em casa (ou na Feira de Ciência) usando um CD para observar o espectro de alguns elementos. Vá até lá (clicando na figurinha abaixo) e confira.

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