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Como Vivem as Estrelas

Como nascem, vivem e morrem as estrelas. O limite de Chadrasekhar. Supernovas e estrelas de neutrons.

Em 1930, o astrofísico indiano Subrahmanyan Chandrasekhar publicou um artigo que se tornou um clássico da literatura astronômica. Nesse artigo, ele demonstrou que estrelas cuja massa ultrapassa de 50% a massa do Sol não morrem de velhas. Na época, ninguém sabia direito o que acontecia com elas. De lá para cá, foi feito um enorme progresso no entendimento da formação, evolução e morte das estrelas. Hoje, com o uso dos telescópios modernos, inclusive espaciais, a astrofísica armazenou um respeitável banco de dados experimentais que vem provocando uma verdadeira revolução em nossa visão do universo. Recentemente, um novo telescópio orbital com detetores de raios-X iniciou seu trabalho de captação de mais dados nessa importante faixa do espectro eletromagnético. Esse telescópio recebeu o nome de Chandra, em homenagem ao grande astrofísico indiano.

Nessa seção especial, nosso assunto são as estrelas. Procuramos dar uma idéia de como elas se formam, como vivem, de onde tiram sua energia e, finalmente, como morrem. Como é usual em nossos relatos, tentamos explicar o que é possível sem usar matemática. No entanto, para quem acha, corretamente, que a matemática, ao invés de complicar, facilita a compreensão, acrescentamos, aqui e ali, algumas equações. Esses trechos ficam em outra cor e quem quiser pode simplesmente pulá-los e ler apenas o texto normal.

Capítulo 1: Nasce uma estrela.

As estrelas nascem em regiões do espaço onde existe uma grande quantidade de gases e poeira. O universo é quase todo vazio mas, aqui e acolá, existem amplas regiões onde a poeira cósmica se acumula. A foto ao lado mostra uma dessas regiões vista por um grande telescópio. Esse é um típico berçário de estrelas.

Inicialmente, todo esse material, composto, principalmente, de moléculas de hidrogênio, está muito disperso. Com o tempo, a atração gravitacional e a pressão da radiação de estrelas já formadas vai gradualmente juntando essas partículas de poeira e gás. Formam-se grandes aglomerados, ou “glóbulos”, individuais que se separam uns dos outros. Esses glóbulos, aos poucos, vão colapsando em regiões cada vez menores. Usualmente, ao mesmo tempo em que vai se compactando, o glóbulo adquire um movimento rotacional e tende a se achatar. Forma-se uma gigantesca “pizza” de poeira e gases girando no espaço, enquanto se contrai. No centro dessa “pizza” cósmica o material vai ficando cada vez mais denso: forma-se uma proto-estrela, isto é, uma estrela em gestação. Com a compressão, a temperatura da proto-estrela vai aumentando e, quando chega a uns 1500 ou 2000 graus ela fica visível, embora quase toda sua radiação seja infravermelha. Esse estágio da vida de uma estrela – sua infância, digamos – dura um milhão de anos, mais ou menos.

Com a atração gravitacional comprimindo, cada vez mais, a proto-estrela, a temperatura na região central alcança uns 8 milhões de graus. Tamanha temperatura quebra os átomos do gás, separando os núcleos dos elétrons. Nesse ponto, começam as reações nucleares no centro da estrela. São reações de “fusão”, do mesmo tipo das que acontecem nas bombas de hidrogênio. Os prótons dos átomos de hidrogênio, separados de seus elétrons e sob a ação da enorme pressão no centro da estrela, se juntam (ou “se fundem”), formando núcleos de hélio.

O esquema das reações nucleares no centro das estrelas é o seguinte. Dois prótons (núcleos do hidrogênio) se juntam para formar um deuteron (núcleo do deutério) mais um pósitron e um neutrino:

p + p –> D + e++ neutrino.

Depois, o deuteron se combina com outro próton para formar um núcleo de hélio 3:

D + p –> 3He ( + radiação gama ).

Finalmente, os núcleos de hélio 3 se juntam para formar um núcleo de hélio 4, liberando dois prótons:

3He + 3He –> 4He + p + p.
A massa do produto da fusão (hélio 4) é um pouquinho menor que a soma das massas dos núcleos que se fundiram. A diferença de massa é liberada na forma de energia, conforme a famosa equação de Einstein,
E = mc². Como a velocidade da luz (c) é muito grande, pequenas quantidades de massa se transformam em grandes quantidades de energia. No cômputo geral, uma gigantesca quantidade de energia é liberada por essas reações nucleares no centro da estrela e ela atinge sua luminosidade normal. A estrela “se acendeu”.

Agora, a compressão causada pela gravidade passa a ter um adversário à altura: a pressão para fora exercida por essas explosões nucleares na região central da estrela. Eventualmente, estabelece-se um “equilíbrio dinâmico” entre essas duas tendências. A estrela entra em sua fase adulta, na qual ficará por alguns bilhões de anos. No capítulo seguinte, vamos falar com mais detalhes sobre esse estado de equilíbrio em uma estrela normal, como o Sol.

Capítulo 2: Um dia do Sol.

Atualmente, os astrofísicos acham que sabem direitinho o que se passa dentro de uma estrela “normal”, como o Sol. Até há pouco tempo ainda havia um pequeno calo no sapato desses teóricos: a quantidade de neutrinos emitidos pelo Sol, como resultado das reações nucleares que descrevemos no capítulo anterior, estava bem abaixo do previsto pela teoria. Recentemente, porém, surgiu uma explicação para isso, como falaremos mais adiante.

Uma estrela “em equilíbrio”, como o Sol, está sob a ação de forças que tendem à contração e de forças que tendem à expansão. Esse equilíbrio se dá quando essas tendências opostas se equivalem por um longo tempo – alguns bilhões de anos – até que uma delas vence a disputa.

A única força atrativa que faz a estrela tender a se contrair é a gravidade. Contra ela agem alguns efeitos expansivos, três dos quais são os mais importantes: a pressão térmica, a pressào de radiação e a pressão quântica.

A pressão térmica é a mais intensa, no caso do Sol, e também a mais fácil de entender. É a pressão usual, devida ao movimento incessante das moléculas do gás muito quente que forma a estrela.
Essa pressão térmica na estrela é dada por uma expressão bem simples:

P = 2 (N/V) kT

onde N é o número de atómos na estrela, V é o volume da estrela, k é a constante de Boltzmann e T é a temperatura. Para haver equilíbrio é necessário que a pressão P e o volume V satisfaçam à seguinte condição:

3 PV = – UG

onde UG é o potencial gravitacional total da estrela.

A energia total na estrela é a soma dessa energia potencial com a energia cinética das partículas (prótons e elétrons), que vale Ec = 3 NkT. Um cálculo completo mostra que:

ET = Ec + U = – (G M2 N2) / R

onde G é a constante gravitacional e M é a massa de um núcleo.

A energia total é negativa, como é típico de sistemas sob a ação da gravidade. Note um resultado curioso: se a estrela perde energia por radiação, o que sempre acontece, a energia cinética das partículas aumenta e ela fica mais quente! Uma estrela como o Sol tem, portanto, calor específico negativo.

O segundo efeito é a chamada “pressão de radiação”. Radiação, no caso, é toda a luz emitida pela estrela, visível ou não. Em algumas estrelas, essa pressão é preponderante. No caso do Sol, é secundária, se comparada com a pressão térmica.

O terceiro efeito é chamado de “pressão quântica” e relaciona-se com um princípio físico devido a Wolfgang Pauli. Segundo esse princípio – dito “de exclusão” – dois elétrons não podem ocupar simultaneamente um mesmo volume cuja dimensão seja da ordem de um comprimento de onda de De Broglie ( ~ h/mv). Por causa desse princípio, o gás de elétrons (chamado de “gás degenerado”) resiste à compressão e gera a pressão quântica para fora.

O Sol já está nesse estágio de equilíbrio há cerca de 4,5 bilhões de anos e a previsão é que permanecerá nele por mais uns 5,5 bilhões de anos. A energia que mantém esse equilíbrio provém das reações nucleares que ocorrem no centro do Sol. Em cada segundo, cerca de 800 milhões de toneladas de hidrogênio se transformam em 796 milhões de toneladas de hélio na parte central do Sol. A diferença de 4 milhões de toneladas se converte em energia segundo a expressão de Einstein E = mc². Um bocado de energia, não é?

O que acontecerá com o Sol quando todo seu combustível nuclear (o hidrogênio) for consumido? É o que contaremos no próximo capítulo.

Capítulo 3: O destino das estrelas.

Praticamente todas as estrelas têm massa entre 0,1 e 30 vezes a massa do Sol (que escrevemos, para abreviar, como Mo). Com menos de 0,1 Mo a atração gravitacional não consegue iniciar a fusão nuclear e a estrela nunca “acende”. Com mais de 30 Mo a compressão é rápida demais e o aumento exagerado de temperatura varre o gás das camadas externas atrapalhando o crescimento da proto-estrela. Esse tipo de “superstar” cósmico brilha intensamente, vive pouco e morre prematuramente, como seus semelhantes no mundo do rock. Vejamos, então, o que acontece com as estrelas na faixa entre 0,1 e 30 Mo.

Em estrelas com massa menor que 1,4 Mo a fusão nuclear continua até que 90% do hidrogênio é consumido. Isso leva uns 10 bilhões de anos. Depois desse estágio de equilíbrio, o núcleo central da estrela começa a encolher, fica ainda mais quente e queima rapidamente o hidrogênio restante. O enorme calor faz as camadas externas se expandirem e esfriarem. A estrela começa a inchar e ficar mais avermelhada – vira uma “gigante vermelha”.

Isso ocorrerá com o Sol e ele ficará tão grande que engolirá Mercúrio, Vênus e a Terra. A estrela vive nesse estágio cerca de um bilhão de anos. No núcleo, o hidrogênio está no fim e a temperatura é tão alta que o hélio começa a se “fundir” em elementos mais pesados. A estrela fica uma “gigante amarela” por mais um bilhão de anos até que o hélio do núcleo começa também a escassear. A estrela volta a aumentar e ficar vermelha de novo. A pressão de radiação é agora predominante e “sopra” as camadas externas da estrela para fora formando uma névoa (ou “nébula”) em torno da estrela. Essa névoa, que os astrônomos chamam de “nébula planetária”, embora nada tenha a ver com planetas, vive relativamente pouco tempo e acaba se dispersando. No centro, todo o combustível nuclear foi consumido e a estrela esfria um pouco, virando uma “anã branca”. No estágio de anã branca a estrela está com sua massa concentrada em um volume pouco maior que o volume atual da Terra e sua densidade é muito grande. Depois de mais uns bilhões de anos a estrela apaga totalmente e vira uma “anã negra” invisível.

Estrelas com massa entre 1,4 e 8 Mo também terminam a vida como anãs brancas por um processo um pouco diferente do descrito acima. Nelas, a ejeção de material se dá antes que fiquem gigantes. Quando sua massa fica menor que 1,4 Mo elas evoluem para anã branca.

Em estrelas com mais de 8 Mo o combustível nuclear é gasto muito rapidamente: em apenas uns 100 milhões de anos todo o hidrogênio da estrela é consumido. Daí, elas também incham e viram gigantes vermelhas. Quando o núcleo fica muito denso, o hélio já formado começa a se fundir em carbono e oxigênio. Com o aumento da pressão, formam-se também o silício e o ferro. Aí, a gravidade exagera e a estrela, de tão densa, não agüenta e colapsa. Algumas dessas estrelas conseguem se equilibrar nesse estágio de altas pressões e temperaturas e terminam como estrelas de neutrons, sem nenhum evento espetacular. Outras, porém, simplesmente explodem. Nessas, um processo catastrófico desencadeia uma tremenda explosão e a estrela vira uma supernova. É o que contaremos a seguir.

Capítulo 4: Morte de uma grande estrela.

Estrelas com grande massa não vivem muito tempo; obesidade nunca é saudável. Além disso, acabam explodindo de forma espetacular. Antes de explodir, a estrela pesada (M > 8 Mo) tem um núcleo muito compacto. Nele, a temperatura já está tão alta (~1010 graus) que as reações nucleares lá dentro chegam até a formar o elemento ferro – e param por aí, pois o ferro não se funde. Por que não? Porque a “queima” nuclear, como, aliás, a queima normal, só acontece se a reação liberar energia. A fusão de núcleos de ferro, para formarem elementos ainda mais pesados, absorve energia. E ainda não existe energia disponível para isso no núcleo da estrela, antes dela explodir.

Quando a massa do núcleo da estrela, que nesse estágio é composto quase só de ferro, alcança um valor em torno de Mo, não dá mais para sustentar. A gravidade vence tudo de roldão e o núcleo da estrela colapsa até se reduzir a uns 10 quilômetros de diâmetro, em frações de segundo. BUM! O núcleo explode e lança uma tremenda onda de choque que se espalha pela estrela. No processo, elementos mais pesados que o ferro chegam a se formar. O núcleo, depois desse momento, se constitui praticamente só de neutrons e neutrinos. Em poucos segundos, os neutrinos são ejetados, carregando quase toda a energia do colapso. A quantidade de energia liberada é incrível. Equivale a umas 100 vezes toda a energia produzida pelo Sol durante toda sua vida de 10 bilhões de anos!

A tremenda onda de choque continua se propagando até alcançar a superfície e arrebentar a estrela toda. Num instante, a luminosidade da estrela cresce enormemente. Quando essa luz chega à Terra, é vista como uma nova estrela brilhante – daí seu nome.

A camada de gás ejetado pela supernova se espalha pelo espaço levando consigo os elementos pesados recentemente sintetizados. As supernovas, portanto, são fornalhas naturais onde esses elementos são produzidos. As camadas remanescentes se espalham a partir da estrela explodida e podem ser vistas por centenas de milhares de anos como enormes regiões nebulosas.

A mais famosa supernova da história foi vista em 4 de Julho de 1054. A explosão, na verdade, ocorreu uns 6500 anos antes dessa data, pois esse foi o tempo que a luz levou para vir da estrela até nós. Astrônomos chineses e japoneses registraram bem direitinho o aparecimento e o aspecto dessa supernova. Os europeus, em plena Idade Média, não registraram nada. Hoje, os restos dessa explosão constituem a Nebulosa do Caranguejo, onde vemos uma grande nuvem de gás se espalhando. A figura ao lado mostra essa nuvem que é vista na constelação de Touro.

Bem mais recentemente, em 1987, foi vista e registrada uma supernova que se tornou muito importante porque os astrônomos estavam bem preparados para estudá-la de forma sistemática. É a história que contaremos a seguir.

Capítulo 5: A supernova 1987A e os neutrinos.

A supernova 1987A foi vista, pela primeira vez, por astrônomos canadenses trabalhando no Observatório Las Campanas, no Chile, em 24 de fevereiro de 1987. Foi um tremendo golpe de sorte pois os cientistas puderam registrar o momento exato em que a luz da explosão chegou à Terra. Como vimos no capítulo anterior, os teóricos calculavam que a explosão de uma supernova deveria liberar uma grande quantidade de neutrinos, e que alguns desses neutrinos deveriam passar pela Terra pouco depois da chegada da luz da explosão. Pois em 1987, por sorte, já existiam dois grandes detetores de neutrinos na Terra: um nos Estados Unidos e outro no Japão.

Esses enormes detetores, situados no fundo de minas profundas, tinham sido construidos para detetar decaimentos de prótons. Até hoje, nenhum decaimento de próton foi detetado. Só neutrinos. Hoje em dia, a principal missão desses detetores passou a ser só essa: detetar neutrinos. Outro golpe de sorte foi que esses detetores eram pouco sensíveis aos neutrinos de baixa energia emitidos pelo Sol mas respondiam muito bem aos neutrinos energéticos lançados por uma supernova. Isso facilitou enormemente a caracterização dos neutrinos que chegaram da supernova 1987A. Nos segundos subsequentes à chegada da luz da 1987A os dois detetores acusaram a chegada de muitos neutrinos. Foi um sucesso! Os teóricos tiveram seus modelos de supernova comprovados até quantitativamente. Deu até para concluir que a onda de choque da explosão levou duas horas para ir do centro da estrela até sua superfície.

Hoje, a supernova 1987A é vista no céu apenas como uma nuvem de gás em expansão. A foto ao lado mostra essa nuvem de gás, vista pelo telescópio espacial Hubble.

Como dissemos anteriormente, os teóricos ainda tinham um problema relacionado com os neutrinos produzidos pelo Sol. Eles chegam na Terra em número bem menor que o previsto pelos cálculos baseados nas reações nucleares no centro da estrela. Se as contas deram certo com a supernova 1987A, por que não se ajustavam ao caso dos neutrinos de menor energia vindos do Sol?

Foram construidos outros enormes detetores de neutrinos, agora capazes de medir neutrinos de menor energia. Além disso, surgiu uma explicação teórica para a discrepância. Segundo esse modelo, os neutrinos emitidos pelo Sol teriam o mau costume de se transformar em outros tipos de neutrinos, esses impossíveis de serem detetados. Essa transformação aconteceria se os neutrinos tivessem massa. Pois bem, recentemente o detetor SuperKamiokande, no Japão, comprovou essa hipótese. Parece que o enigma foi resolvido e os astrofísicos acham que já sabem tudo sobre o comportamento de uma estrela normal, como o Sol.

Capítulo 6: O limite de Chandrasekhar.

Subramanyan Chandrasekhar (Chandra, para os amigos) nasceu em 19 de Outubro de 1910 na Índia, então colônia inglesa. Aluno brilhante, aos 18 anos publicou seu primeiro trabalho cuja originalidade lhe valeu uma bolsa para se doutorar na Inglaterra. Aos 20 anos de idade, Chandra embarcou para a Inglaterra. Na viagem, apesar de sofrer fortes enjôos com os balanços do navio, conseguiu desenvolver uma sofisticada teoria sobre a evolução das estrelas. Nesse estudo, aplicou a relatividade de Einstein e algumas técnicas da mecânica quântica que tinham acabado de ser desenvolvidadas por Enrico Fermi e Paul Dirac. O resultado mais surpreendente de seus cálculos foi a constatação que nem toda estrela terminava sua vida como uma anã branca, como pensavam os astrofísicos da época. Chandra descobriu que as anãs brancas só podiam ter massa igual ou menor que 1,4 Mo, valor que é chamado hoje de “limite de Chandrasekhar”.

Usando correções relativísticas no cálculo da pressão exercida pelo gás degenerado de elétrons, Chandrasekhar mostrou que essa pressão não podia exceder hcN4/3, onde h é a constante de Planck, c é a velocidade da luz e N é a densidade de elétrons. A temperatura equivalente será então kT ~  hcN1/3. Para contrabalançar a contração gravitacional de uma estrela de massa M é necessária uma temperatura média GmM/R, onde m é a massa do elétron. Como N ~m/MR³, segue-se que M não pode ser maior que (hc/G)3/2/m2. Substituindo os valores dessas constantes obtém-se cerca de 1,4 massas do Sol. Esse valor é o “limite de Chandrasekhar”.

A figura abaixo mostra como o raio de uma estrela varia com sua massa. Um cálculo que não leva em conta as correções da relatividade encontra que o raio deve decrescer com o aumento da massa da estrela, mas só vai a zero para uma massa infinita. Qualquer estrela terminaria sua vida como uma anã branca. Com a correção usada por Chandra o raio vai a zero quando a massa se aproxima de 1,4 massas do Sol.

Resultado tão surpreendente, descoberto por um cientista tão jovem, oriundo de um país pobre, deveria ser saudado como um grande acontecimento. Mas, não foi isso que aconteceu imediatamente, como relataremos no capítulo seguinte.

Capítulo 7: O conflito entre Eddington e Chandrasekhar.

Sir Arthur Eddington

Na Inglaterra, o resultado descoberto por Chandrasekhar foi recebido com ceticismo pelos astrofísicos. O mais famoso deles era Sir Arthur Eddington, por quem o jovem Chandra nutria uma profunda admiração. Foi usando os modelos teóricos de Eddington para a estabilidade de uma estrela que Chandrasekhar mostrou que uma estrela com massa maior que 1,4 Mo não podia se estabilizar no estado degenerado de uma anã branca. Mas, Eddington não gostou nem um pouco dessa modificação de seu modelo e declarou isso publicamente. Em uma reunião da Sociedade Real de Astronomia, logo após Chandrasekhar apresentar seu trabalho, Eddington fez uma longa crítica ridicularizando o resultado do indiano. Em certa altura de seu discurso, ele disse:

“Chandrasekhar, usando a relatividade, mostrou que uma estrela de massa maior que um certo M nunca esfria. A estrela segue irradiando e irradiando e se contraindo até que, eu suponho, chega a uns poucos quilômetros de raio, quando a gravidade torna-se forte bastante para segurar a radiação, e a estrela pode finalmente alcançar a paz. Eu acho que deve haver uma lei da natureza que evita que uma estrela se comporte dessa maneira absurda!”

Essa opinião desfavorável e agressiva do maior astrofísico da época deixou Chandra chocado e deprimido. O pior é que praticamente todos os seus colegas astrofísicos deram razão a Eddington, certos de que o jovem indiano tinha cometido algum erro em seus cálculos, já que era essa a opinião do grande mestre.

Desacreditado pelos colegas, Chandra apelou para os grandes caciques da Física, entre eles, Niels Bohr, Wolfgang Pauli e Paul Dirac. Todos apoiaram o resultado do indiano, embora não o fizessem de forma muito explícita, por respeito a Eddington. Decepcionado, poucos anos depois, Chandrasekhar aceitou um convite para trabalhar em Chicago, nos Estados Unidos, onde acabou permanecendo até morrer, em Agosto de 1995.

A teimosia de um grande cientista como Arthur Eddington atrapalhou o reconhecimento do valor de Chandrasehkar e de seu surpreendente trabalho. Só após mais de uma década os astrofísicos começaram realmente a acreditar que o limite encontrado por Chandra estava realmente correto. E apenas em 1983, mais de 50 anos depois da publicação de seu trabalho mais famoso, Chandrasekhar foi agraciado com o Prêmio Nobel de Física.

O curioso nisso tudo é que Eddington deixou escapar por entre os dedos a glória de prever a existência dos buracos negros. Lendo novamente a citação que reproduzimos acima notamos que ele entendeu, corretamente, que a relatividade usada por Chandrasekhar implicava na existência de estrelas que seguram até a luz. Em vez de aceitar esse resultado e desenvolvê-lo até às últimas consequências, ele preferiu fazer pouco do jovem colega. Deu-se mal e bem que mereceu.

Capítulo 8: S. Chandrasekhar e o brasileiro Mário Schenberg.

O grande físico brasileiro Mário Schönberg trabalhou algum tempo com Chandrasekhar em Chicago, nos Estados Unidos, no início dos anos 40.

Mário Schönberg

Em 1942, eles publicaram um artigo no Astrophysical Journal, intitulado “On the evolution of the main sequence stars”, que é considerado um clássico da literatura dessa área. Nesse artigo, o processo de “queima” gradual do hidrogênio no núcleo central de uma estrela normal, como o Sol, é descrito detalhadamente.

O trabalho dos astrofísicos ganhou muito charme e interesse depois de várias descobertas feitas recentemente, com o uso de modernos telescópios, alguns deles em órbita, como o Chandra, telescópio de raios-X, que há pouco entrou em funcionamento. Temas grandiosos como o big-bang, a expansão do universo, os buracos negros etc, fazem parte do dia-a-dia dos astrofísicos de hoje. Em breve voltaremos a essas estimulantes matérias nessa nossa página.

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